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Conic - A "Faixa de Gaza" não é aqui



Harmonia cultural e religiosa no Conic / Tina Dornelas

De um lado, fiéis de igrejas tradicionais conservadoras, de outro frequentadores de espaços alternativos inclusivos. Com diversos elementos que poderiam tornar o Conic um campo de batalha, o local se confirma como um ambiente de tolerância cultural e religiosa.
Inaugurado na década de 60, o centro de comércio e entretenimento está localizado no Setor de Diversões Sul, ao lado da rodoviária do plano piloto. Sua pluralidade atrai um público eclético. Toda diversidade cultural, regional, social, racial, política e religiosa cabe lá dentro. O espaço abriga bares, lanchonetes, restaurantes, sindicatos, comitês de partidos políticos, boates, galeria e faculdade de teatro, sauna, salões de beleza, estúdios de tatuagens, lojas variadas e igrejas de diversas religiões.
Fachada do Conic / Foto: Tina Dornelas
A Igreja Universal do Reino de Deus foi a primeira a chegar. Flávia Portela, prefeita do Conic conta que no início ocorreram transtornos com frequentadores de alguns bares, mas aos poucos a política da boa vizinhança prevaleceu.
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Universal, a primeira das seis igrejas do Conic / Foto: Tina Dornelas

Atraídas pela localização central, baixo custo dos aluguéis e estrutura apropriada para cultos, outras igrejas passaram a ocupar os espaços das salas de cinema do Conic.


                                            Igreja ocupa espaço do antigo cine pornô / Tina Dornelas

Os fiéis da Igreja evangélica Ministério Marca da Promessa convivem pacificamente lado a lado, com os frequentadores de uma das casas LGBTS mais antigas de Brasília, o Espaço Galleria
O último culto acontece às 20 horas. O movimento da boate aumenta de madrugada. A alternância de horários facilita o desencontro dos frequentadores diferenciados e a possibilidade de confronto entre eles.
Prefeita do complexo desde 2004, Flávia garante que a convivência é tranquila.  “O Conic é um setor muito permeável. Nós temos um regimento comum, assinado, que todos têm conhecimento, mas não é uma regra, não é uma lei. Eu nunca vi briga, não tem essa história lá”, ressalta.
A Igreja Pentescostal Deus é Amor fica no sub-solo do edifício Baracat, que faz parte do complexo comercial do Conic e o último culto acontece às 19 horas.


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Cultos diários em horários variados / Foto: Tina Dornelas
Diversidade
No subsolo do edifício Eldorado, o mais central do Conic, está localizada a igreja inclusiva Comunidade Athos há nove anos. A entrada é pela portaria B, que dá acesso às salas comerciais do prédio. Não existe nenhuma placa de identificação LGBT, nem na fachada do prédio e nem na porta da sala no final do corredor.
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Portaria de entrada da Comunidade Athos / Divulgação

Os cultos acontecem nas noites de quarta e sábado de maneira muito discreta, conduzidos por uma pastora numa sala simples, sem altar e sem imagens religiosas. A única identificação da comunidade LGBTS é um banner na parede do fundo com a logomarca e o site da entidade.


Aceitação de fiéis LGBTS
Um dos fiéis, que preferiu não se identificar comenta a necessidade de uma igreja inclusiva. “As igrejas tradicionais não nos aceitam. O nosso desejo é estarmos juntos. Deus não nos criou para esta separação”, lamenta. Segundo ele, ainda existe muito preconceito na sociedade. “A ideia da igreja inclusiva não é uma festa para os homossexuais. Muitos não conseguem entender que um gay possa ter uma religião. Alguns acham que vão encontrar uma boate, mas quando chegam aqui veem que é uma igreja como outra qualquer, que acredita na Trindade Santa – Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito e segue a bíblia sagrada”, esclarece.
Para um dos frequentadores mais antigos, a sinalização de mais tolerância por parte do líder da igreja católica é muito significativa para toda a comunidade. “O Papa Francisco é uma voz importante dentro do cristianismo no mundo. Quando ele abre os braços para os homoafetivos, as outras igrejas também podem começar a aceitar e aí nós poderemos conquistar mais respeito”, ressalta.
Umbanda e candonblé foram pioneiros no Conic / Foto: Guilherme Lopes

Localizada ao lado de um bar e de uma igreja, a loja de artigos de umbanda e candomblé, que está no Conic há 26 anos, já passou por alguns atritos com os vizinhos religiosos. A proprietária do estabelecimento, Helena Mesquita, conta que houve uma época em que a entrada da loja amanhecia com sal ou arruda, e que um pastor chegou a dizer que estava lutando para tirar os proprietários do local, mas atualmente a convivência é totalmente pacífica entre eles.
A chegada de um novo pastor construiu uma relação cordial com os donos da loja. “Ele chegava, dava bom dia, ficava conversando comigo e com meu marido. Ele dizia: ‘eu não tenho preconceito com religião, porque cada um acredita naquilo que gosta e no que quer’. Ele me deu um livro sobre todas as religiões e tenho ele até hoje em casa.”, relembra Helena.  Desde então a convivência se mantém harmoniosa.
Quanto aos outros comerciantes, transeuntes e até mesmo as demais igrejas no Conic, a proprietária diz que não há nenhum conflito e que a relação é tranquila. “Às vezes, algumas pessoas passam e viram a cara, outros, que vêm de fora, se benzem ou coisa do tipo, mas nunca mais tive problema”, conta ela.
Desde a inauguração da capital federal, o Conic segue por décadas recebendo pessoas, de diferentes tribos, crenças e orientações sexuais. Isso comprova que é possível conquistar uma convivência harmoniosa e pacífica, no mesmo espaço.

Por Tina Dornelas e Guilherme Lopes - Esquina Online